18/07/2009

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-Até mesmo nós, os possuídos, nos afastamos dele. Ignoramos-lhe por muitos anos. Se o senhor Kazuma não tivesse me pedido, ou melhor, me implorado para que ele viesse morar comigo longe da sede, acho que nunca teria tido a oportunidade de lhe conhecer melhor.

Apesar do rumo da conversa entre o escritor e o médico ter mudado um pouco, internamente nada havia mudado em Hatori. Ele volta a acender mais um cigarro e senta-se no sofá ao lado do Shigure.

-Vamos torcer para que não tenha que apagar as memórias da Hanajima-san.

-Se o kamisama me ordenar, nada poderei fazer.

-Sim, essa seria uma decisão do nosso kamisama. É ele quem protege o segredo de nossa maldição.

-Exatamente! Naquele dia não foi para o kamisama que você pediu para se casar, mas sim para o patriarca dos Sohmas.

-Mas ela me respondeu como sendo o Kamisama dos possuídos. Por isso não me deu permissão para me casar com a Kana.

Hatori se lembra da conversa anterior que teve com o escritor, e novamente a dúvida que lhe ocupava a mente, tinha se tornado ainda maior.

-Shigure....

-O que foi Haa-san?

-Depois da nossa conversa de ontem..... Não, esquece! Eu acho que estou ficando louco!

O médico se levanta do sofá e vai apagar o cigarro que ainda estava pela metade no cinzeiro que estava em cima da mesa de trabalho do escritor.

-Se o próprio médico está dando o laudo, eu não serei contra.

-Shigure..... Akito-san não me deu autorização para me casar com a Kana por ser uma mulher?

O cão apenas olhava ao primo que estava voltando para se sentar no sofá ao seu lado.

-Será que Akito-san sentia alguma coisa por mim?

#Finalmente ele percebeu!#

-Estou com esse pensamento desde ontem, mas acho que é loucura. Nunca que o kamisama poderia se apaixonar por um de seus possuídos.

-Ela se apaixonar por mim quando era criança.

-Mas era diferente. Ela nem sabia ao certo o que era ser o kamisama.

Shigure sente um pouco de pena do possuído ao ver o quanto que ele estava apavorado com a idéia de que poderia ser amado de uma maneira especial pelo kamisama e era por isso que tentava desesperadamente encontrar explicações e a comprovação de que estava errado.

-Você conversou sobre isso com Akito-san?

-É claro que não! Nunca que iria comentar isso com ela.

-Sei.

-Esquece. Isso foi apenas uma imaginação minha. Acho que estava bem próximo de ser uma alucinação até.

O médico se levanta do sofá ainda mais agitado do que estava. Verbalizar o que estava sentindo só tinha feito que tudo parecesse ainda mais impossível de ser verdade.

#Como eu pude ter essa idéia? É claro que Akito-san não permitiu o meu casamento por conta da nossa maldição, e não porque ela nutria algum tipo de sentimento por mim. Quanta pretensão a minha de imaginar que Kamisama pudesse sentir algo por mim.#

O escritor volta a senta-se de uma maneira tão relaxa no sofá e apenas fica o observando. Ele não se achava no direito de contar ao Hatori sobre os sentimentos da Akito. Aquilo tinha que ser resolvido entre os dois apenas.
-Estou voltando para a sede.

-Vá com cuidado, Haa-san. Passarei por lá ainda essa semana.

O médico e o Shigure vão até a cozinha para ele se despedir dos demais, mas apenas encontra o Ayame que estava sentado a mesa, criando alguns novos figurinos.

-Ayaa, onde estão os garotos?

-O meu amado, lindo, maravilhoso, fantástico, perfumado, inteligente e adorado irmãozinho e o Haru-kun foram dá uma voltinha. A meu pedido, que estou desejando fazer um maravilhoso almoço hoje, para comemorarmos o dia em que o meu amado irmão tomou o seu primeiro café da manhã com a minha ilustríssima pessoa, eles foram até o supermercado buscar alguns ingredientes que estavam faltando. O nosso maravilhoso e talentoso médico ficará para almoçar conosco?

-Não. Tenho que voltar para a sede agora. Até mais, Ayame.

Hatori é acompanhado pelo dono da casa até a porta. Shigure podia perceber que o médico estava pior do que havia chegado. Entretanto, mesmo sentindo pena do primo, ele não consegue deixar de se divertir com aquela situação. Ao ver o Hatori, o que sempre tinha sido o senhor todo certinho, sangue frio e racional durante toda a sua vida naquele estado era algo que alegrava o escritor. Seu estado era de pânico, mas ao mesmo tempo continha uma certa gentileza.

by DonaKyon

15/07/2009

109


Hatori apaga o cigarro no cinzeiro que segurava com a mão esquerda e olha para o escritor que ainda estava sentado de maneira tão relaxada no sofá.

-E o que aconteceu para mudar o tipo de amor que sentia por ela.

-Eu comecei a desejar outra pessoa. Basicamente sentia a mesma vontade de estar com ela, de lhe proteger, mas não a desejava... Eu nunca beijei a Akito... Nunca quis ter esse tipo de envolvimento com ela. Quando percebi isso, descobri que a amava como irmã.

-Então é possível amar sem desejar uma pessoa.....

-Podemos amar a várias pessoas ao mesmo tempo. O amor é como as nuvens do céu, pode ter vários tamanhos e formatos. Ao mesmo tempo em que podemos desejar mais de uma pessoa ao mesmo tempo. Porém, acredito que apenas faremos de tudo para nunca magoar apenas uma pessoa de cada vez. Para mim fidelidade é isso. É o esforço que faço diariamente para nunca magoar o Ayaa.

Hatori se levanta da poltrona e começa a caminhar pela biblioteca. Estava muito agitado, angustiado, amedrontado. O possuído pelo espírito do dragão se consumia internamente com uma dúvida que não o tinha deixado dormir naquela noite. Tinha vontade de encarar o problema de frente, mas o medo de confirmar as suas suspeitas era tão grande que o impedia. Shigure apenas acompanhava o passeio do médico com o olhar.

-É melhor eu voltar para sede....

-Tem alguém doente por lá?

-Apenas uma das empregadas de Akito-san.

Hatori então se lembra da Akito tão frágil na noite anterior e o seu coração acelera um pouco. Ainda podia sentir o calor do corpo de Akito em seus braços.

#Será que ela acordou melhor essa manhã? Ontem à noite a deixei dormindo, mas não sei se ela conseguiu dormir a noite toda.#

-Ué, o Doutor Hatori Sohma agora está atendendo aos serviçais do patriarca?

-Esse foi um caso especial, porque a Akito-san se simpatizava com ela.

-Como? O patriarca se simpatizando por uma de suas empregadas? Que fato mais surpreendente. O que tem essa pessoa em especial para conseguir tal afeto do patriarca dos Sohmas?

-A garota lembra a Eiko-san.

-A Eiko-san?? Eu vou com você até a sede.

Shigure já estava de pé ao lado do médico assim que escutou tal nome.
-Não precisa se preocupar com Akito-san. Ela ficou muito abalada, mas eu consegui a deixar um pouco mais tranqüila.

-Mas é grave o que a empregada tem?

-Não. Mas Akito-san já ordenou para que ela vá trabalhar longe da sede.

-Justamente agora o fantasma da Eiko-san tinha que voltar?

Shigure volta a se sentar, mas não da forma tão relaxada que estava antes. Mantinha agora o tronco para frente e segurava as mãos, era visível que o escritor estava preocupado.

-Por que ficou tão preocupado assim?

-Por causa do Kyo. Não quero que o ódio de Akito por ele volte a crescer. Desde que ele veio morar aqui eu estava conseguindo amenizar um pouco as coisas com o patriarca. E precisamente agora começou a namorar uma pessoa normal. Droga! Estou com um péssimo pressentimento com relação a isso. Acho que o seu caso com a Kana pode acontecer novamente.

-Se não for ainda pior.

-O Ayaa também acha isso.

-Sabemos pelos antigos relatos que os Kamisamas sempre odiaram os possuídos pelos espíritos dos gatos. Não se sabe a razão do ódio, mas todos foram odiados.
-Mas no caso do Kyo tem um agravante a mais. O fato da mãe dele. Akito transferiu para ele toda a culpa do que aconteceu com a Eiko-san. Dizia que por culpa dele nunca mais poderia ter a Eiko-san de volta.

-Todos do clã fizeram o mesmo que Akito-san, dizendo que ela se matou porque não suportou o filho que teve. Quem é de fora, falava até que o Kyo era filho de uma traição e que foi por isso que ela teria se matado.

by DonaKyon

12/07/2009

108


Ao final, o romântico café da manhã para dois acabou virando um divertido café para quatro. Yuki estava um pouco mais aliviado após a conversa com o Shigure e o Ayame, e ver os dois juntos fez o garoto ter certeza que não havia nada de errado no fato de ele gostar e desejar outro homem.

-Vamos até a biblioteca Haa-san.

-Que?

-Você não veio pegar aquele livro emprestado?

Shigure não conseguia mais segurar a curiosidade que estava sentindo. Sabia que algo tinha acontecido com o médico, pois, apesar de estar de estar com um aspecto de tranquilidade, o possuído podia sentir o quanto ele estava agitado por dentro. E a sua intuição lhe dizia que era algo relacionado ao patriarca. Shigure se levanta da mesa e o médico vai atrás dele, deixando os dois irmãos na cozinha.

-Agora irá me contar o que está acontecendo.

-Nada está acontecendo.

Os dois chegam à biblioteca e encontram um hospede dormindo no chão com um livro sob o rosto.

-Haa-kun?!

O possuído ao escutar o seu nome tira um pequeno pedaço do livro sob o olho direito para ver quem é que estava lhe chamando e vê os dois primos parados na porta.

-Bom dia Sensei. Bom dia Tori-san.

-Mais um que faltou a aula hoje. Shigure, você como tutor está sendo péssimo.

-Eu não tenho culpa de nada. A culpa é dos hormônios deles.

-Quem foi que faltou também?

-O Yuki-kun. Ele acabou perdendo a hora.

-Sei...

O escritor e o médico percebem que a fisionomia do garoto tinha ficado um pouco triste.

-Haa-kun se levante e vá até a cozinha tomar café da manhã.

O boi faz o que o escritor havia mandado deixando os dois adultos à porta fechada dentro da biblioteca.

-Parece que já vi esse filme antes.

-Hehehe.... Mas o assunto não é esse agora. O que aconteceu?

-Já te respondi que nada.

-Haa-san, é muito feio mentir.... Olha que o seu nariz pode crescer... ahahahahah

O médico já sabia que o escritor fazia aquelas piadinhas infame para deixá-lo mais a vontade.

Hatori senta-se na confortável poltrona que ficava abaixo da janela e tira o maço de cigarros do paletó do terno, enquanto que o Shigure se sentava no sofá de dois lugares que ficava bem de frente para a poltrona. Os dois permanecem em silêncio por alguns instantes. O médico podia sentir o quanto que a sua freqüência cardíaca estava acelerada. Ele queria conversar com o escritor, mas não sabia como iria começar aquele assunto.

Shigure observa a mão do médico que estava segurando o cigarro na boca e nota que ela estava um pouco trêmula.

-Nunca tinha visto a sua mão tremendo. Achava que as mãos dos médicos nunca tremiam.

-....

-Por que está tão ansioso assim? Você veio até aqui para me contar. Vamos, comece a falar de uma vez.

-....

Shigure dá um suspiro e se encosta-se ao sofá. Ele tinha uma forte intuição a respeito do que estava deixando o médico naquele estado, pois ele mesmo já tinha passado por aquela mesma situação quando era mais novo. O escritor passa a mãos nos cabelos e dá mais um suspiro antes de continuar a falar.

-Você descobriu!

-Estou com medo de ter descoberto coisas que nunca deveria saber.

-O que exatamente não queria descobrir?

-Que Akito-san é uma mulher.

-Mas, a gente sabia que ela era mulher desde que Akito nasceu.

-Mas até ontem eu sempre a vi como se fosse um homem. Mais do que isso, como se fosse apenas o nosso kamisama. Nunca a tinha visto com uma linda e solitária mulher.

-E descobriu apenas isso?

O coração do médico começa a bater ainda mais forte. Ele dá uma tragada no cigarro enquanto olhava o lindo céu azul pela janela. Shigure não consegue segurar o pequeno sorriso que surge em seus lábios, estava achando fascinante presenciar o medo, que ele já tinha sentido, em outra pessoa.

-Shigure..... Por que deixou de amar a Akito-san?

-Eu nunca deixei de amá-la. Continuo a amando até hoje, mas não como uma mulher e sim como uma irmã.

by DonaKyon